segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Co(r)po meio cheio/vazio.

Há dias vazios.
Ultimamente todos os dias são vazios.
Nem o calor de uma alegria
Tão pouco o gelo da separação.
Pensei que a saudade
Ainda servisse para fazer volume
Para ocupar espaço
Talvez para dar algum significado.
Afinal,
dias cheios de saudade
Não seriam dias vazios.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Carta ao(s) Leitor(es).

É certo que não escrevo para alguém.
Podia começar a chamar ordinário e infame, a todo e a qualquer leitor deste ESPAÇO. Podia escrever coisas sem nexo, sem pontuação (isso também Saramago fez, e não ofendia ninguém! A não ser, talvez, os iluminados que julgam perceber muito do assunto, difamando este génio criativo sem nunca terem tocado num livro!). Podia escrever coisas feias, mesmo feias, calão do puro para agradar ao people da pesada. Até mesmo com asneiras! Podia (d)escrever o meu dia, revelar aos invisíveis leitores (do que passaria a ser o meu diário) segredos profundos e carregados de mágoa, que me assombram o sono, os sonhos, que me fazem desfazer em lágrimas, antes mesmo de os tornar parte da minha imaginação! Ainda seria capaz de escrever coisas convencionais para me agradar a mim mesma, aos que me rodeiam, para que esses lessem e comentassem, só positivamente, como é evidente. Porém escrevo para uma multidão de sujeitos inexistentes, que choram e riem com a ironia ou com a dor que projecto nas letras e nas palavras. É para esses que escrevo. É para esses hoje que falo, como nunca antes falei, pois não fomos formalmente apresentados e não gosto de falar com estranhos, nem mesmo por telefone.
A vocês, que se mantêm no silêncio do meu pensamento, um Obrigada.

Nunca deixem de acreditar na força das palavras, mesmo quando bramidas num deserto infinito de sombras e passagens. Pois, mesmo no deserto quem tu és, quem eu sou, estará sempre presente e será sempre o mais importante leitor.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Janela .

Tenho um vazio
Cheio de horas perdidas
A dançar diante do espelho.

A ponta do pé quase toca
Quase roça
A beira da janela aberta.
Deixa entrar o infinito
Da manhã clara.

As nuvens dissiparam
No ar paira ainda o cheiro molhado
De relva verdejante.

Agora,
Talvez dance no parapeito da janela
Para que o infinito me chame
Me envolva.

Já sinto o pé a tocar na nuvem que não está lá.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Não cama não se fala de todo.

[Acto I]
- Olha...
- Diz lá...
- O que vês?
- Mais uma pergunta idiota! Vejo o tecto, a brancura sem graça de um tecto alto.
- Só é tecto que vês?
- Se levantar um pouco o pescoço do travesseiro talvez consiga ver o candeeiro, mas de nada vale, pois nesta penumbra apenas veria sombras.
- Mesmo assim.. Lamento que nada vejas!
- Nada?
- Sim, nada. Numa noite estrelada como esta deverias ver todas as constelações do hemisfério Sul.
- Lá estás tu! A persiana tem o estore corrido para baixo, nenhuma estrela veria se levantasse o pescoço.
- Pois eu consigo ver, mas talvez seja eu.
- Que estrelas vês tu afinal?
-As do infinito. As estrelas que os teus olhos deixaram escapar quando me cravaste as unhas nas costas, me gritaste ao ouvido um segredo interminável de palavras soltas e te deixaste cair no meu regaço. Nessa altura não havia limites e as estrelas desprenderam-se inquietas. São essas que vejo.
- Ora, que estupidez. Vamos dormir agora, sim?

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Desatinos.

Não sei porque ainda espero. Não tenho mais posição sentada nesta cadeira vulgar. Talvez se tentar dormir um pouco, talvez o tempo passe mais depressa se não olhar o relógio, talvez se fechar os olhos. Acho que o tempo está a passar, mas não o posso garantir, pois de olhos cerrados, ansiando o sono, não o posso verificar. Talvez devesse ver as horas. Só mais uma vez. Se ele vier e eu não estiver acordada, ele pode partir! Não posso permitir que tal aconteça, afinal, já estou com demasiadas dores de ficar nesta posição ordinária esperando que o tempo passe para ele chegar. Tenho que lhe fazer a melhor das recepções. Com muito calor, pois se ele entrar por aquela porta saberei o frio que sentiu. Pois o vidro baço, coberto de milhares de gotículas frias, não passa despercebido à lareira que arde, no canto da sala, junto do vaso partido e da estante vazia. Ele virá com a sua face lívida e os seus lábios enrugados do frio, e talvez me faça arrepiar quando se aproximar da minha pele quente. Demasiado quente, diria. Escorre, efectivamente, um fio de suor pelas minhas costas, contornando a coluna dorsal como um pincel deslizando sobre a tela em branco, no inicio da manhã laboral de um artista de rua. Não me quero mexer, embora o suor me incomode à medida que escorre. Porém, se me mexer a dor crescerá e eu não saberei suportar mais a espera.
E se ele chega e eu estiver limpando esta maldita secreção natural?

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010